Categoria: Artigos
Data: 21/10/2024
Reforma 507 anos
A Pregação na Reforma como uma das marcas da Igreja
Cláudio Marra

Durante a Reforma, a pregação da Palavra de Deus se tornou central no culto e na vida das igrejas reformadas. Os reformadores, como Lutero, Zuínglio e Calvino, resgataram a importância ao sermão, substituindo o foco medieval nos sacramentos por uma ênfase na exposição bíblica contínua e sistemática, conhecida como lectio continua. Lutero, por exemplo, via a pregação como um meio indispensável de graça, e sua própria experiência de culpa e absolvição associada à descoberta do evangelho o levou a advogar a pregação da salvação pela graça de Deus em vez da ênfase medieval no medo e penitência. Seus sermões, assim como os de Calvino e Zuínglio, buscaram libertar os cristãos da opressão espiritual e levá-los ao perdão por meio da fé.

Zuínglio iniciou a pregação expositiva sistemática em Zurique em 1519, começando com o Evangelho de Mateus, marcando o início oficial da Reforma nessa cidade. Ele e Calvino uniram a pregação à autoridade suprema das Escrituras, rejeitando tradições humanas e doutrinas eclesiásticas que não pudessem ser comprovadas pela Bíblia. A pregação, para eles, deveria não apenas ser bíblica, mas também prática, aplicando-se diretamente à vida dos fiéis.

A pregação reformada, portanto, não se limitava a discursos isolados, mas fazia parte integrante do culto, apoiada por orações, cânticos e os sacramentos. Na Segunda Confissão Helvética de 1566 Heinrich Bullinger afirma que "a pregação da Palavra de Deus é a Palavra de Deus", o que reflete a crença de que Deus está presente e atuante sempre que a sua Palavra é pregada. Lutero identificou a pregação e a Escritura como sendo “Palavra de Deus”. Segundo Calvino, quando a Palavra de Deus é pregada corretamente e com fidelidade, Deus está presente e ativo ali. Na sua visão, a pregação é um veículo pelo qual o Espírito Santo opera nos corações dos ouvintes.

Os reformadores treinaram gerações de pregadores comprometidos com a fidelidade às Escrituras e com o anúncio da graça redentora de Cristo.
Tais treinamentos foram vistos, por exemplo, no sistema de "Profecia" em Zurique, liderado por Ulrico Zuínglio, que começou em 1525. Diariamente, exceto às sextas-feiras e domingos, ministros e estudantes de teologia se reuniam na Grande Minster para uma hora de intenso estudo bíblico. Esse sistema envolvia a leitura da passagem do dia em latim, grego e hebraico, seguida por comentários textuais detalhados. Em seguida, Zuínglio ou outro ministro pregava um sermão sobre o texto em alemão, atraindo também a participação de trabalhadores locais. A "Profecia" não era apenas um exercício acadêmico, mas um seminário teológico diário que influenciava diretamente a comunidade de Zurique – muitos crentes ajustavam seus horários e não perdiam essas pregações. Seu nome foi inspirado em 1Coríntios 14, onde Paulo fala sobre o dom de profecia para edificação da igreja.

Já em Genebra, João Calvino adotou um sistema similar com as "congregações", encontros semanais que ocorriam às sextas-feiras e reuniam pastores e estudantes para intensa instrução bíblica. Realizados no Auditoire, ao lado da catedral de São Pedro, esses encontros visavam formar pregadores capacitados para liderar as igrejas reformadas. Calvino, assim como Zuínglio, utilizava a lectio continua, pregando expositivamente por capítulos e versículos, sempre enfatizando a aplicação prática do texto bíblico à vida cotidiana dos fiéis. Ele mantinha o compromisso de iniciar seus sermões exatamente no ponto onde havia parado. A Palavra de Deus era a base da Reforma.

Esses sistemas de formação e pregação criaram uma geração de pregadores profundamente instruídos nas Escrituras. O modelo de Genebra, assim como o de Zurique, também se espalhou, influenciando igrejas em toda a Europa e no Novo Mundo. Ambos os sistemas exemplificam o compromisso dos reformadores com uma igreja centrada na Palavra de Deus, onde a pregação não era meramente ritualística, mas transformadora e educativa.

Para mais informações sobre esse tópico, veja Adoração na Reforma (Jonathan Gibson & Mark Earngey), Adorando com os reformadores (Karin Maag), Fazendo teologia com os reformadores (Gerald Bray) e Lendo as Escrituras com os Reformadores (Timothy George), todos da Cultura Cristã.

O Rev. Cláudio Marra é o Editor do Brasil Presbiteriano e da Cultura Cristã.


Autor: Jornal Brasil Presbiteriano   |   Visualizações: 1468 pessoas
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